Há pouco mais de dois anos, a Linda Lifetech decidiu deixar o Brasil rumo ao Canadá. A mudança de São Paulo para Toronto, levando patentes e a licença da marca, foi motivada pela avaliação de que, no hemisfério norte, teria o apoio que não teve no País para avançar na proposta de criar uma tecnologia para detecção precoce do câncer de mama.
Essa decisão se mostrou acertada. Após dificuldades para arrecadar recursos no Brasil, dependendo de family and friends e dos fundadores para financiar suas atividades, a healthtech conseguiu pela primeira vez levantar capital institucional.
A empresa captou R$ 10 milhões em uma rodada seed liderada pela Sky River Ventures, fundo de venture capital com sede em Boston e foco em deeptech, healthtech e soluções de ciência aplicada, na qual foi avaliada em US$ 5 milhões post money.
É um montante inédito para a Linda em oito anos de existência e que permitirá à companhia deixar de apenas sobreviver e avançar nos planos de internacionalização e consolidação do mercado brasileiro.
“Brincávamos que sempre demos voos pequenos, menos altos e mais curtos, porque a nossa colcha era sempre mais curta: você puxava e descobria os pés”, diz Rubens Mendrone, CEO da Linda, ao NeoFeed. “Agora temos capacidade de execução de 24 meses e vamos avançar com nossos planos nos próximos dois anos.”
Entre os objetivos está obter licenças regulatórias nos Estados Unidos e no Canadá para abrir o mercado norte-americano, algo que a companhia espera alcançar no próximo ano. Mendrone destaca que a aprovação pela FDA, agência reguladora americana para medicamentos e alimentos, abre caminho para outros mercados globais.
Um segundo objetivo, ligado à obtenção das licenças nos Estados Unidos e no Canadá, é a execução de estudos clínicos da tecnologia em parceria com o Princess Margaret Cancer Centre, quinto maior centro de pesquisa em câncer do mundo, localizado no Canadá.
A ideia é validar com o instituto, referência global no tratamento do câncer, os dados que já indicam que a tecnologia é segura e capaz de detectar precocemente o câncer de mama. No primeiro teste clínico, com 322 mulheres em São Paulo, Paraíba e Ceará, publicado em 2023, a solução da Linda mostrou eficácia.
“Conduzir um teste clínico longo, de três anos, com a robustez que eles têm, vai nos colocar em patamar técnico-científico mais elevado”, diz Mendrone. “Isso nos dará mais credibilidade na comunidade médica e científica e fundamentará nossos pedidos de expansão regulatória.”
Outra prioridade é ganhar tração no Brasil, onde a Linda já possui as certificações da Anvisa desde 2020 e é fonte das receitas da empresa, com o faturamento anual atualmente na casa dos R$ 12 milhões.
O plano de expansão avançava lentamente pela falta de recursos. A Linda atende cinco grupos de clientes – governos, hospitais, clínicas particulares, seguradoras e farmácias –, incluindo Grupo DPSP e Rede Pró-Vida, no Rio Grande do Sul.
Mendrone afirma que a captação e os planos de expansão ocorrem em momento de maior maturidade da empresa, com governança e processos estabelecidos. Ele destaca que o valuation baixo da rodada reflete a escolha de trazer investidores especializados em saúde ao cap table, em vez de buscar avaliação maior.
“Saímos de ser uma startup que não sabia se existiria no mês seguinte para ser uma startup com board e estrutura robusta de investidores”, diz.
Muito dessa evolução veio da mudança para o Canadá. Ao mesmo tempo que o novo endereço forçou a Linda a reestruturar sua base societária e legal e a melhorar o produto para competir com nomes locais, Mendrone diz que a companhia foi “abraçada” pelo setor público e privado.
Além da parceria com o Princess Margaret Cancer Centre, a Linda foi incluída na aceleradora Creative Destruction Lab (CDL), especializada em ciência e tecnologia, e recebeu apoio da Sociedade Canadense de Câncer.
O governo canadense também embarcou na tese, fazendo a conexão da empresa com o governo da Suíça, que resultou num acordo para a realização de testes da tecnologia da Linda em três cantões (equivalente a estados) do país.
Com esse apoio, a Linda deixou para trás as dificuldades e começa a vislumbrar o futuro após os 24 meses garantidos pela rodada seed. Para Mendrone, o próximo passo deve ser uma rodada Série A, para levantar cerca de R$ 30 milhões.
“A consequência dos testes, da aprovação regulatória e do crescimento de receita nos permitirá pensar numa Série A para financiar o novo ciclo de crescimento, voltado para América do Norte e Europa”, afirma.


